Em estudo feito nos EUA com 300 pessoas que sofriam de depressão, psiquiatras subestimaram queixas dos pacientes
Sintomas causados por drogas têm impacto na qualidade de vida e, muitas vezes, provocam o abandono do tratamento.
Ganho de peso, tremor, diminuição da libido, insônia. Uma parcela das pessoas que tomam antidepressivos enfrenta esses e outros efeitos colaterais.
São sintomas que têm grande impacto na qualidade de vida e que explicam, muitas vezes, o abandono do tratamento. Apesar disso, psiquiatras e outros médicos que prescrevem essas drogas negligenciam a questão.
É o que indica uma pesquisa a ser publicada no “Journal of Clinical Psychiatry”. As queixas dos 300 voluntários sobre os efeitos colaterais dos remédios foram 20 vezes mais frequentes do que as observadas por seus psiquiatras.
Os pacientes anotaram, em uma lista de 31 efeitos colaterais, a frequência com que os sentiam e o grau de incômodo que representavam. Depois, os pesquisadores checaram, nas fichas médicas deles, os dados de efeitos colaterais anotados pelo médico de cada paciente.
Mesmo quando os pacientes descreveram os efeitos como frequentes ou muito incômodos, os médicos os registraram com uma frequência duas a três vezes menor nas fichas.
Zimmerman diz que estudos sobre essas drogas, patrocinados pela própria indústria farmacêutica, devem estar subestimando seus efeitos negativos.
Para Ana Luíza Camargo, coordenadora do núcleo de medicina psicossomática e psiquiatria do hospital Albert Einstein, as queixas do paciente nem sempre são ouvidas. “No afã de tratar, é possível que passem despercebidas.”
Renério Fráguas, coordenador da residência do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo, considera o alerta importante para psiquiatras, mas, principalmente, para não especialistas. “Eles tratam um porcentual significativo de pacientes com depressão, mas, como cuidam de outros aspectos, falta tempo para olharem mais para isso.”
Fráguas diz que muitos sintomas não são causados pelo remédio, mas pela depressão. A opinião é semelhante à de Miguel Roberto Jorge, professor-associado de psiquiatria da Unifesp. “Muitos pacientes têm queixas múltiplas”, diz.
Segundo Jorge, os diferentes antidepressivos têm eficácia muito parecida, daí a importância dos efeitos colaterais na escolha do remédio. “Estamos tão preocupados em saber se houve redução dos sintomas como em saber se apareceram efeitos colaterais”, acredita.
Efeitos colaterais estão entre os principais motivos que levam a pessoa a interromper a medicação. “Acontece com frequência, o que é uma pena, porque poderíamos esclarecer se o problema vai continuar, se representa perigo ou, se for o caso, trocar o remédio”, diz Jorge. Para ele, a maioria desses efeitos não ameaça a saúde, mas os pacientes não sabem disso.
Segundo Fráguas, se a depressão está sendo tratada pela primeira vez, a tendência é trocar o remédio que dá muitos efeitos. Mas, se a pessoa já se tratou antes ou apresenta um quadro grave, o indicado é tentar subir a dose aos poucos, para minimizar efeitos colaterais.
Para Camargo, do Einstein, se a queixa é comprovada e causa muito desconforto, pode ser hora de partir para outra droga. Mas ela crê que há casos em que é preciso tolerar algum efeito colateral. “Com uma conversa, pode ser administrável.”