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ANOREXIA E BULIMIA SE ENCONTRAM COM AS DROGAS E O ÁLCOOL

“Manorexia”. Ortorexia. Diabulimia. Transtorno alimentar de binge.

Todas essas são variações perigosas dos distúrbios alimentares de anorexia e bulimia, e se tornaram termos comuns que aparecem a todo momento em sites, blogs, matérias de jornais e televisão. Enquanto as revistas de celebridades relatam os casos dos glamourosos e dos sofredores, terapeutas e um número cada vez maior de pesquisadores tentam tratar e compreender esses quadros.

O último verbete a entrar no léxico das doenças alimentares é a “álcoolexia”, termo que designa uma mistura complicada de comportamentos: o jejum auto-imposto ou a alimentação exagerada seguida de eliminação forçada, combinados com o abuso de álcool.

Alcoolexia não é oficialmente um termo médico. Mas indica um fenômeno preocupante em relação ao abuso de substâncias e aos distúrbios alimentares. Entre as pessoas descritas como alcooléxicas estão os adolescentes que bebem descontroladamente, principalmente mulheres, e que passam fome o dia todo para compensar as calorias do álcool que consomem. O termo também está associado a distúrbios alimentares sérios, principalmente com a bulimia, que freqüentemente envolve um comportamento de abusar da comida – e do álcool – e depois forçar sua eliminação.

Os anoréxicos, por restringirem severamente seu consumo de calorias, tendem a evitar o álcool. Mas alguns bebem para se acalmarem antes de comer, ou para atenuar a ansiedade causada por terem exagerado em uma refeição. Outros consomem álcool como sua única fonte nutritiva. Outros ainda, usam drogas como cocaína e metanfetamina para suprimir o apetite.

“Algumas mulheres têm medo de colocar uma uva na boca, mas não têm problemas em beber uma cerveja”, diz o Dr. Douglas Bunnell, diretor se serviços médicos da clínica-dia do Renfrew Center, na Filadélfia.

O centro, da mesma forma que um número pequeno mas cada vez maior de instituições que tratam de distúrbios alimentares e dependência química, a maioria na Costa Oeste dos Estados Unidos, tem uma abordagem dupla focada no abuso de substâncias e nas desordens alimentares.

Bunnell, ex-diretor da Associação Nacional de Transtornos Alimentares, diz que a obsessão pela magreza e a aceitação social da bebida e das drogas – aliadas à noção recente de que, entre as celebridades, entrar para uma programa de reabilitação é quase uma moda, algo absolutamente chique – são em grande parte culpadas pela situação.

“Ambas as desordens são comportamentos glorificados e estimulados”, diz Bunnell. “Abusar do álcool é sinônimo de ser descolado e de estar em alta, e perder peso e ser magro é um imperativo cultural para as mulheres mais jovens nos Estados Unidos. Unir os dois não é nenhuma surpresa, e isso chegou a um ponto alarmante em termos de conscientização pública.”

Os psicólogos dizem que os distúrbios alimentares, como outras dependências, estão freqüentemente enraizados na necessidade de anestesiar a dor emocional com substâncias ou com a excitação provocada pelo abuso de alimentos. Os distúrbios são normalmente desencadeados por traumas de infância como abuso sexual, negligência e outras fontes de angústia mental.

A “manorexia” é a versão masculina da anorexia. A ortorexia é a obsessão com os alimentos considerados saudáveis – eliminando gorduras e conservantes, por exemplo. Mas as pessoas com esse quadro correm o risco de se privarem de nutrientes necessários.

A diabulimia se refere aos diabéticos que se recusam a tomar insulina para não engordarem, uma vez que a substância pode causar ganho de peso. Apesar do nome estar relacionado à bulimia, o distúrbio normalmente não envolve a eliminação forçada.

No Transtorno Alimentar de Binge, a pessoa come compulsivamente, principalmente comidas com muito sal e muito açúcar, mas não pratica o exercício excessivo ou a eliminação forçada para compensar o consumo das muitas calorias.

Judy Van De Veen, 36, que vive em Gillette, Nova Jersey, tornou-se anoréxica aos 24 anos. Ela diz que no início se obrigou a passar fome, dosando pequenas quantidades de alimentos não-calóricos durante dois meses. Depois, começou a comer compulsivamente e a forçar a eliminação, vomitando caixas de cereais matinais, pizzas inteiras e fast food comprada em “drive throughs” que às vezes lhe custava até US$ 80 por dia.

Ela fez diversos tratamentos para seu distúrbio alimentar, tanto dentro quanto fora de clínicas, por vários anos no final da década de 90, com resultados irregulares. Em 2001, ainda sofrendo com a bulimia, começou a beber. Ela conta que se comesse algo enquanto bebia, forçava a eliminação, mas depois consumia mais álcool para compensar a perda, porque queria continuar bêbada.

Muitos bulímicos que bebem usam o álcool para vomitar, dizem os especialistas em distúrbios alimentares, porque é mais fácil fazer isso com o líquido. Eles também tendem a vomitar porque normalmente bebem com o estômago vazio.

“No começo do meu distúrbio alimentar eu não chegava perto do álcool porque ele tem muitas calorias”, diz Van De Veen, que chegou a ser hospitalizada várias vezes por desidratação. “Minha doença é querer mais: eu sempre quero mais, não importa o que.”

Dois anos depois de começar a beber, ela entrou num programa de 12 passos contra o alcoolismo. Ela passou os dois anos seguintes entrando e saindo de programas de reabilitação, gastando cerca de US$ 25 mil de seu próprio bolso porque não tinha um plano de saúde. Mas nenhum dos programas para o alcoolismo estava capacitado para tratar distúrbios alimentares, e então ela continuou comendo exageradamente e vomitando, e seu distúrbio alimentar cresceu.

Van De Veen diz que já está sóbria há três anos, mas ainda sofre com a bulimia. Ela agora tem uma filha de 14 meses, Cheyenne, e diz que a gravidez e os grupos de apoio a tem ajudado a fazer progressos em relação ao transtorno alimentar.

“Eu tinha uma boa desculpa para comer”, disse ela sobre quando estava grávida. “Eu não ligava e adorava comer.”

Mas ela conta voltou a ser assombrada pela tentação de exagerar na comida e vomitar.

 Trish, 27, que sofre de um transtorno alimentar há dez anos, deu entrada na clínica Renfrew recentemente. É a quinta vez que ela é internada em um centro de tratamento ou hospital.

Assim como Van De Veen, Trish, que concordou em ser entrevistada sob a condição de que apenas seu primeiro nome fosse usado para proteger sua privacidade, sofreu primeiro com a anorexia e depois encontrou o álcool. Antes de ser admitida na Renfrew, ela disse que chegava a desmaiar por falta de comida e sofria de uma torturante dor de estômago.

Trish, que é enfermeira e vive em Ohio, onde trabalha com pacientes cardíacos, diz que se obrigava a passar forme durante 8 a 12 horas, durante seus plantões, enquanto olhava para o relógio na espera do momento de tomar seu primeiro “drink”. Beber, diz ela, a deixava relaxada quando tinha de comer na frente de outras pessoas, o que normalmente era uma grande fonte de estresse.

“O álcool foi o que provavelmente manteve algum peso no meu corpo”, disse ela durante uma entrevista, em fevereiro, no Renfrew Center, onde ela deu entrada na noite de ano novo para oito semanas de tratamento.

“Beber me ajudou a ficar menos ansiosa”, diz ela. “Ajudou-me a ser mais a Trish. Os dois caminham juntos: quanto mais eu bebo, mas problemas alimentares eu tenho e vice-versa.”

Estudos mostram que beber compulsivamente e a dependência do álcool estão crescendo entre as mulheres. Elas também são mais suscetíveis do que os homens aos distúrbios alimentares.

Cerca de 25 a 33% dos bulímicos também sofrem com o abuso de álcool e drogas, de acordo com um estudo publicado no ano passado pelo jornal Biologial Psychiatry. Cerca de 20 a 25% dos anoréxicos têm problemas com abuso de substâncias, descobriu o estudo.

Um número cada vez maior de pesquisadores se dedica a examinar as conexões psicológicas e neurológicas entre os distúrbios alimentares e o abuso de substâncias: será que comer uma barra de chocolate, ou então abusar da comida e vomitar, estimulam os mesmos centros de prazer no cérebro que as drogas ou o álcool?

A doutora Suzette M. Evans, professora de neurociência clínica na Universidade de Columbia, começou recentemente um estudo sobre a conexão entre a bulimia e o abuso de substâncias, um campo que, segundo ela, tem sido negligenciado. “As pessoas finalmente estão começando a perceber que a comida pode funcionar da mesma maneira que as drogas e o álcool”, diz Evans.

Enquanto cada vez mais pacientes buscam tratamento conjunto para distúrbios alimentares e abuso de substâncias, pode surgir um cenário complicado de informações cruzadas. A resposta para o vício é a abstinência; mas deixar a comida não é uma opção.

“Tentamos fazer com que nossos pacientes encontrem comportamentos efetivos e desenvolvam habilidades para viver melhor”, diz o Dr. Kevin Wandler, vice-presidente de serviços médicos na clínica Remuda Ranch, que trata tanto distúrbios alimentares quanto a dependência em suas instalações no Arizona e na Virgínia.

“Comer normalmente é considerado um comportamento efetivo, mas é mais fácil deixar o álcool e as drogas porque eles não são necessários para viver”, diz Wandler. “Se a sua droga é a comida, o desafio é maior.”

Trish saiu da Renfrew em 22 de fevereiro, depois de sua segunda temporada de tratamento lá. Disse estar determinada a romper com suas obsessões em relação ao peso, a comida e ao álcool. Antes de entrar na clínica, “eu não tinha energia nem para rir”, diz ela. Mas enquanto se preparava para ir para casa, mostrava uma esperança que não tinha há muitos anos.

“Não vou viver minha vida assim”, disse. “Aprendi dessa vez que não preciso me sentir envergonhada. Quero amar e perdoar a mim mesma.”